Prezados amigos nautas e amantes da vela de plantão, para quem não sabe e não conheçe Bruder, faço aqui um breve apresentação: Ele era em seu tempo como ( ou mais...desculpe são Torben!!)Torben e Scheidt são hoje para a gente, um velejador com bagagem para ser um dos melhores( senão o melhor) do mundo em seu tempo, compartilhamos com os leitores da revista Avelok, The Yacht Man, uma exclusiva e inédita entrevista com o parceiro da lenda Joerg Bruder, Jan Willem Aten , eleito pela ISAF o melhor proeiro do mundo em 1972 , que nos conta curiosidades e fatos de sua história no esporte e seus momentos com Bruder.
Fizemos duas entrevistas , esta escrita e outra por telefone , em um dos longos papos que tive com Jan, um fato que me chamou a atenção foi durante a campanha de Munich, eles correndo com um barco de madeira, comprado no México em 68, o único barco de madeira dos jogos por sinal, os trouxe uma grande desvantagem nos ventos fracos.
Eles começaram mal nas regatas, mas começaram a virar a mesa, de um forma incrível, aí houve o atentado que paralisou os jogos por 3 dias, fazendo com que o vento também ficasse de luto neste episódio terrível que ceifou a vida dos atletas Israelenses, e também a primeira medalha olímpica na vela Brasileira.
Publico aqui a entrevista e logo abaixo republico a matéria que Jan escreveu sobre Bruder morto tragicamente no acidente da Varig em Orly de 1973 quando ia participar do mundial de Finn em La Rochelle, defendendo o quarto título do mundo, morreu levando consigo a taça do tri campeonato mundial de Finn e a taça transitória do melhor proeiro do mundo que ficara com Jan por um ano , para quem quiser saber mais sobre o assunto!
Espero que gostem! Bons ventos e boa leitura!
Alguns títulos do Bruder:
11 vezes Campeão Paulista Finn(*)8 vezes Campeão Brasileiro Finn(*)3 vezes Campeão Sul-americano Finn2 vezes Campeão Norte Americano Finn 3 vezes Campeão Mundial Finn2 vezes Vice-campeão Mundial Finn2 vezes Campeão Jogos Pan-americanos Finn1 vez Campeão África do Sul Finn1 vez Vice-campeão Europeu Finn 1 vez Vice-campeão Mundial Star1 vez Campeão Norte Americano Star2 vezes Campeão Bacardi Cup Star1 vez Campeão Semana de Kiel Star1 vez Campeão Copa Ouro Brasil-Argentina Star2 vezes Campeão Sul-americano Star1 vez Vice-campeão Europeu Star3º lugar Campeonato Mundial Soling1 vez Campeão Internacional Marstrand Soling
Avelok: Onde vocês se conheceram?
Jan Aten: - Velejando de Finn na Represa Guarapiranga em regatas de final de semana, quando ele colocava uma perna no 2º lugar.... Ele me falou a primeira vez num clube esperando entrar o vento quando pedi a ele uma dica sobre meu mastro de madeira. Um sábado de muito vento, “ sertão” ( vento oeste - quente e forte, cheio de rajadas ) todos saindo da água umas 3 da tarde, entrei para treinar virar e desvirar o Finn – fiz umas 6 vezes seguidas. Depois no popa ele apareceu no barco dele e convidou par subirmos o contra vento juntos. No 2º eu estava a barla.. e o homem ficou bravo comigo.. aconteceu algo muito curioso que te conto ao telefone..
Em seguida me convidou, ainda na água panejando, ... para ir ao Rio correr Brasileiro de Star na semana seguinte. Anotou meu telefone. Avisei que nunca tinha entrado num Star. Sem problemas, vamos 6ª feira. Fiz até calças de escorra com acolchoado na bunda. Passou 4:30 da manhã rebocando o barco..Levar o Star foi engraçado, o reboque soltou.... na descida de Aparecida ...ás 600 da manhã..te conto ao telefone...
Ficamos na casa do seu amigo Mario Inneco no Saco de São Francisco, ali em Niterói, dormindo no barco de oceano dele, o MADUSA (iniciais dos nomes dos 3 filhos do Mario Inneco). Lembro que foi a 1ª vez que escutei aquela fita de 8 pistas . Velejando no Rio o Bruder tinha uma rivalidade com o Henri Adler que era Starista de longa data, além do Siemsen. Ganhamos.
Treinando em finais de semana no Rio antes de embarcar o Buho Blanco para Kiel, a melhor velejada foi voltando em contravento ao ICRJ num final de tarde com Sudoeste - o barco chorava...tremia... nivelado com muito vento... “planando no contra vento” como dizia ...e foram tantas outras manhãs e tardes velejando dentro e fora da baía indo muito longe sem qualquer apoio.. Sim de manhã também..já que dormíamos num Box emprestado no Iate Clube...no meio de sacolas de vela, mofo, etc....e tínhamos pouco tempo para treinar antes de viajar..estávamos testando 7 mastros que fabricou,,reduzindo peso no top...etc...para levar a Kiel com anotações de flecha e uso do back.
Avelok: O que poderia dizer que foi o momento mais marcante de sua vida na vela? e seu momento com Bruder?
Jan Aten:-
Acho que a primeira experiência no esporte é sempre marcante. No meu caso foi velejando num final de semana em um barco típico holandês nos arredores da Ilha de Texel, Holanda. O som da água na madeira me fascina até hoje... e lembro bem o dia que realmente vencermos a regata depois de pactuar com o Bruder em terra vencer de qualquer modo aquela regata
Avelok: Me conte mais do convívio do Bruder como pessoa, como ele era?
Jan Aten- Bruder tinha o dobro da minha idade, isso já diz muito. Era rápido, acelerado, técnico, muito sensível e intuitivo, e um tanto briguento.
Avelok: Como ele lhe tratava? como um garoto, ou como um proeiro?
Jan Aten:- O Bruder tinha 36 anos – e eu 18.. eu era um aprendiz ao lado do mestre, vários dias por semana...falava com muito respeito, me pedia para ver adversários atrás e cambadas de outros. Ele não tirava olho das velas, backstay e ondas. Perguntava minha opinião sobre as curvas do mastro e gostava como eu evitava as ondas na escorra. Meu físico era muito bom pernas curtas e tronco longo adequado para escorra longa,. Além disso as regatas duravam mais de 2 horas e em Kiel era quase uma hora para chegar na raia...a gente ia treinando e fazíamos pelo menos um contravento antes da preparação de regata...
Avelok: Quais eventos participaram juntos?
Jan Aten:- Paulista, Brasileiro, 7º Distrito, Semana de Kiel e Olimpíadas..e algumas poucas regatas de final de semana em SP.
Avelok: conta mais sobre a semana de Kiel !
Jan Aten:- Conheci pela primeira vez os top do mundo da vela internacional..veja bem.. só de Star eram 60 barcos...e haviam todas as classes..evento teste pré-olímpico...o cara que me impressionou na água foi Rodney Pattison do Flying Dutchman da GB...velejava de forma absolutamente agressiva no leme, contrariando qualquer orientação de ter a mão-leve no timão
Avelok: Como era o Hubert ? ele ainda é vivo? mora onde se vivo for?
Jan Aten :- O Hubert é vivo, velhinho na Áustria, o filho veleja de Finn ainda
Avelok: Quem eram os mais bacanas da época, como gente!
Jan Aten:- Eu era jovem e novo no pedaço, de um clube sem velejadores representando o Brasil na época, ou seja, admirei velejadores experientes.- no Iate Clube Paulista conheci o Dino Pascolato sempre um gentleman, homem educadíssimo, muito amigo do Bruder. Admirava o Reinaldo Conrad e seu proeiro Buckard Cordes e já conhecia o Klaus Biekarck, Alex Welter, o Peter Ficker, todos do YCSA. Do Rio conheci os irmãos Axel e Eric Schmidt, muito diferentes um do outro, e tenho saudades do Patrick Mascarenhas, companheirão da mesma idade que nunca mais vi. O Gastão Brun na Semana de Kiel sempre muito engraçado falando mal do Dragon que ele tinha de usar quando estava acostumado ao Soling...... e como disse antes o grande amigo do Bruder no Rio, o Mario Inneco.
- Lá fora conheci o pessoal do Finn, o Thomas Lundquist da Suécia, o Carl Van Dyne dos EUA com quem mantive troca de cartas e que faleceu alguns anos depois, Uwe Mares da Alemanha , o Hubert Raudaschl. O cara mais simpático dos Staristas era o Durward Knowles, das Bahamas, que por sinal já participara das Olimpíadas por várias vezes. Um homem educado, divertido, contador de estórias fantásticas.
Avelok: Como era a cena da vela?
Jan Aten:
- Em SP haviam rivalidades.. bobagens entre clubes..política...coisas feias, do passado...mas tudo amador quase por que dependia do investimento pessoal..não havia patrocínio..vela de alto rendimento pago por confederação..o máximo que conseguia era passagem ( reembolso muitas vezes depois de 60 dias) e transporte de barco.. o Bruder investia pesado pois tinha de vender mastros, propagandear, .e velas vendia velas Raudaschl aqui. Quando voltei da Semana de Kiel e da Olimpíada o pessoal de meu clube São Paulo Yacht Club (de origem inglesa) não se interessou muito... solicitei ajuda burocrática para importação de um Finn num programa da federação de vela de SP..., negaram a minha inclusão - desisti pois não tinha $ para comprar barco atual.
Avelok :Como eram as pessoas? Jan Aten
-Um pouco frias, rivais, eu era visto como um garoto intruso na panela local...o Bruder tinha alguns desafetos, ainda vivos.. melhor não falar sobre isso.
Avelok: O que sentiu ao chegar na Europa para velejar??
Jan Aten:
- Entusiasmo, e tudo novidade, colorido, Kiel é vela..velejador sem conhecer a Semana de Kiel ainda não sabe o que é evento de regata de vela..
Avelok: Depois dos jogos vc foi morar fora certo?
Jan Aten:
- Sim. Fiquei na Alemanha um tempo com muita dificuldade. Voltei ao Rio e trabalhei uns meses com o Pelicano. Consegui uma viagem aos EUA como tripulante num cargueiro chinês onde só se comia pé-de-porco na sopa (prato típico chinês), arroz e chá ... jogava baralho com o capitão para ganhar uns biscoitos importados - me virei – ficava no timão do navio em um turno.
Consegui trabalho numa veleria Tampa, EUA ajudando e aprendendo a desenhar velas..– velejava para testar as velas, ensinar o trim, vender ... final de semana ganhava um trocado como trimmer de barcos de oceano, half-tonners..Ranger, etc... .. depois tornei-me um demonstrador do Laser na região, em finais de semana o representante regional me levava para uma praia ou clube, ficava velejando mostrando o barco a interessados - a novidade chamada Laser!. Curiosamente anos antes eu fiz testes no protótipo em Kiel pois o projetista canadense velejou de Star em Kiel
Avelok: e a vela como ficou na sua vida desde então?
Jan Aten:
- Velejei mais em SP sem competir na ponta, sempre faltou $ para equipamento, barco e velas.. competir sem igualdade de material. Comecei a usar barcos de outros, e timoneava Lightnings do Arne Arnesen, do Ricardo Fleishflesser, amigos aos quais sou muito grato até hoje
Fiz algumas velas protótipo para Snipe com tecido importado, vendia apenas bujas
Comprei um Laser para brincar e aos poucos sem motivação fui jogar tênis..fui até professor de tênis...
Avelok: Obrigado Jan, foi um prazer conversarmos a respeito da história do Bruder, que para tantos como eu foi um exemplo de velejador e de pessoa, aproveito para desejar a todos uma excelente semana , com muito mar e vento a favor, e se tiver mau tempo a gente enfrenta , por que mar calmo não faz bom marinheiro!!
Saiba mais da vida de Bruder , por Jan Willem Aten:
Bruder velejava com grande maestria na técnica e na tática, sempre com uma atitude séria e competitiva. Conhecia e desenvolvia o seu Finn, criando detalhes de peças e trabalhava obcecadamente desenvolvendo menor peso e a melhor performance de flexão nos mastros de madeira. Além disso, Bruder tinha muita força física e preparava-se com treinos de permanência na escora em uma cadeira adaptada em sua casa.
No Brasil, além de ser professor de Geologia na Universidade de São Paulo, fabricava mastros, retrancas e outras peças em madeira e alumínio. Bruder desenvolveu os mastros de alumínio da classe Finn nas instalações da Tecelagem Santa Constância de seu amigo Dino Pascolatto. Também tinha como amigo e parceiro comercial o fabricante de vela austríaco Hubert Raudaschl.
Nos anos 60, depois de velejar de Iole Olímpico por algum tempo, despontou na classe Finn vencendo o Campeonato Paulista por 9 vezes seguidas com grandes adversários como Claudio Biekarck e Alex Welter, além de tantos outros. Participou de grandes campeonatos no exterior, sendo 2 vezes campeão nos Jogos Pan-Americanos e foi Tri-Campeão Mundial de Finn em seu barco, o “Neguinho”, numeral BL3.
Joerg Bruder começou a velejar internacionalmente na classe Star em 1971. Foi ao Mundial na Venezuela com Claudio Biekarck na proa, seu grande adversário local na classe Finn e terminaram como vice-campeões. Isso animou Bruder a escolher o Star para participar dos Jogos Olímpicos de 1972. Além disso, Bruder estava decepcionado pela decisão dos organizadores de fornecerem barcos da classe Finn o que impediria de usar seu próprio equipamento.
Bruder então convidou Jan Aten, um velejador de Finn como proeiro. Utilizando o “Buho Blanco”, numeral BL 5217, um Star de madeira adquirido no México, venceram o Campeonato Brasileiro e 7º Distrito de Star no Rio de Janeiro. Em seguida foram campeões na Semana de Kiel 1972 tendo 60 adversários da vela mundial na época que disputavam vagas por seus países e desejavam competir nos Jogos Olímpicos, como Willy Kuhweide, Alan Holt, H. Raudaschl, Uwe Mares, Flavio Scala, David Forbes, Stuart Jardine, David Knowles e Pelle Petterson.
Bruder trabalhava diariamente para desenvolver detalhes nos mastros, no casco do barco e nas velas. Criou uma peça de “self-tack” de buja na classe Star, uma inovação que permitia bordejar rapidamente para vencer duelos de contra vento especialmente em ventos fortes.
Bruder e Aten treinavam em dias da semana na Represa Guarapiranga em São Paulo, com o barco do Dino Pascolatto, montado similarmente ao “Buho Blanco” então na Alemanha. Rebocavam o Star com o pequeno VW Variant na madrugada de sábados e voltavam no domingo á noite depois de treinar na raia fora da Baía de Guanabara.
Bruder não se preocupava muito com a beleza e arrumação do barco, mas com a performance e simplicidade de manobras. Um dia em Kiel, Paul Elvstrom, que velejava então de Soling, veio ao “Buho Blanco”, subiu no trailer, olhou dentro do cockpit e vendo que o barco era de madeira, exclamou: “How is it possible that this boat sails so fast?” (Como é possível que este barco anda tão rápido?)
Em Kiel, durante Agosto e Setembro de 1972 quase todos os dias pela manhã e noite, Jan Aten lixava o Star dentro da água gelada com roupa de borracha, limpando o casco, o leme e a quilha, buscando maior velocidade. Preferiam os ventos fortes, ouvir mastro e estai amento “zumbir” no vento, e a madeira do casco “ranger” nas ondas. “Planar” nas pernas de través e de popa com gaibes rápidos era a especialidade.
Nas regatas em Kiel os ventos fracos dominaram os primeiros dias prejudicando a expectativa e o material escolhido na medição. E o atentado em Munique interrompeu a seqüência de regatas. Mas, após alguns resultados ruins Bruder e Aten conseguiram uma reação (com alguma superstição) com uma vitória e um segundo lugar, e disputaram medalhas até a última regata, mas ficaram na 4a colocação geral dos Jogos Olímpicos.
Joerg Bruder faleceu em 1973, em um fatídico vôo da Varig em Orly, Paris, quando ia á La Rochelle na França, em busca de seu 4º título mundial de Finn.
Restepping a mast during a regatta - Dick Enersen writes, "Huge kudos to Paul Cayard and Phil Trinter for their performance on Tuesday in the Star Trials in San Francisco. To be able to replace a mast and then go out and win two races is truly impressive.
It should be noted, just for historical interest, that their accomplishment is not without precedent. In the 1972 Olympics, sailed in Kiel, the great Brazilian Finn sailor Joerg Bruder competed in the Star Class. On the way out of the harbor, Bruder and his crew Jan Aten snagged a shroud on a piling and brought the rig down on their heads. They calmly got the boat back to the dock, brought down a spare mast, stepped it, rigged it and sailed out to win that day's race.
---